Na semana passada foi sancionada pelo Presidente da República a Lei da Liberdade Econômica, Lei nº 13.874/2019, oriunda da MP 881/2019, que trouxe algumas mudanças importantes para a Indústria de Fundos de Investimento no Brasil.
Os princípios que norteiam o texto da Lei são: (i) presunção de liberdade no exercício de atividades econômicas; (ii) presunção de boa-fé pelas entidades privadas; e (iii) mínima intervenção do governo federal na economia.A primeira mudança importante foi a inclusão no Código Civil dos artigos 1.368-C a 1.368-F, incluindo o CAPÍTULO X- DO FUNDO DE INVESTIMENTO.O primeiro artigo trata sobre a natureza jurídica dos fundos de investimento, deixando expresso o que já estava consolidado no mercado, de que os fundos são constituídos na forma de condomínio de natureza especial (Art. 1.368-C do CC). A doutrina sempre criticou a qualificação condominial dos fundos, pois não eram atribuídos aos investidores cotistas diversos direitos assegurados pelo Código Civil a um condomínio. No entanto, a lei veio para clarificar que se trata de um condomínio especial, que deve observar disposição específica de regulamentação da CVM e não as regras específicas de condomínio do Código Civil.
Ainda nesse artigo (Art. 1.368-C, §3º do CC), a lei estabeleceu que os registros dos regulamentos dos fundos devem ser feitos na CVM e que dessa forma são suficientes para garantir a sua publicidade e oponibilidade em relação a terceiros, o que elimina a burocracia, custos e dá celeridade ao processo de constituição e alteração desses documentos.
Na sequência, a lei estabelece a limitação de responsabilidade, passando cada cotista a responder apenas com o valor de suas cotas (Art. 1.386-D, I do CC) e cada prestador de serviço fiduciário a responder pela sua própria função, sem solidariedade (Art. 1.368-D, II).
Ficou claro agora que os fundos respondem diretamente por suas obrigações legais e contratuais e que os prestadores de serviço não respondem por essas obrigações, mas respondem pelos prejuízos que causarem quando procederem com dolo ou má-fé, devendo sempre se levar em consideração os riscos inerentes às aplicações nos mercados de atuação do fundo e a natureza de obrigação de meio de seus serviços (Art. 1368-E do CC).
Importante destacar que as limitações de responsabilidade são aplicáveis a todas as classes de fundos e os já existentes deverão chamar assembleia para mudar os regulamentos se quiserem adotá-las, abrangendo apenas os fatos ocorridos após a mudança. Já os novos fundos poderão escolher como querem funcionar (Art. 1.368-D, §1º do CC).
Até a publicação da lei, a regra aplicada era que o administrador poderia vir a chamar os cotistas para aportar novos recursos no fundo para cobrir eventual patrimônio negativo (Art. 15 e 79, §3º da INCVM 555/19). Com o advento da lei (Art. 1.368-E, §1º do CC), o fundo com limitação de responsabilidade que não possuir patrimônio suficiente para responder com suas dívidas seguirá o regime da insolvência do Código Civil (Art. 955 a 965 do CC). A insolvência poderá ser requerida por seus credores, por deliberação dos próprios cotistas ou pela CVM.
A lei trouxe também a possibilidade da criação de classes de cotas com direitos e obrigações distintos, com chance de se constituir patrimônio segregado por classe. Isso não é uma inovação para o mercado, pois já existe regulamentação da CVM possibilitando que alguns tipos de fundos, tais como os imobiliários, em participações e os fundos de direito creditórios, tenham classes segregadas. A expectativa é que a CVM edite novas regras de forma possibilitar a ampliação dessa nova regulamentação.
Escrito pela Dra. Roberta Bastos, advogada, com atuação na área de Direito Empresarial e Mercado Financeiro.